Anotações de 1937 – 38

~ Anotações feitas por Ajahn Buddhadasa entre 1937 e 1938 ~

Existe sempre alguma coisa de que nós precisamos sem sabermos o que é:

Existe sempre alguma coisa de que nós precisamos sem sabermos o que é, tanto quanto ainda não tenhamos realizado o estado de Arahant. O Grande Ser saiu à procura do arrefecimento de dukkha apesar de que não sabia o que era! Nós mesmos podemos observar exatamente aqui que todas as coisas que recebemos são incapazes de fazer com que os nossos corações parem e descansem em paz. Todos os tipos de contaminações mentais ainda dominam, sempre, os nossos corações. O problema mais difícil que enfrentamos é que precisamos sempre de algo mais especial, mas não sabemos e não podemos responder a nós próprios o que é. Porém, este problema mais difícil desaparecerá imediatamente quando descobrirmos o Buddha-Dhamma, que nos revela que temos caído continuamente num movimento rotativo. (Início do ano 2840/1937)

A Integralidade do Prajña Buddhista

A integralidade do Prajña (sabedoria) buddhista:

Um aspecto diz respeito à causa que faz com que nós, seres humanos, desejemos fazer várias coisas. O Dr. Sigmund Freud, de Viena, o principal psicólogo do século XX diz que é devido a duas causas, nomeadamente, a agitação do sexo e o desejo do poder e da fama. O Prof. John Davey, um filósofo, diz que isso é somente “o desejo de ser alguém importante”.

Podemos constatar o caráter incompleto destas palavras quando descobrimos que a sabedoria buddhista fala de três causas, isto é, kamatanha (desejo pela sensualidade), bhavatanha (desejo por ser & ter), & vibhavatanha. Os primeiros dois correspondem aos de Freud. O último, porém, é o mais completo. Vibhavatanha significa “desejo de não ser”, por exemplo, não querer morrer, lutar para escapar à morte, e assim por diante.

Se examinado cuidadosamente, isso será compreendido como sendo um dos aspectos da integralidade do Prajña buddhista. Algumas pessoas distinguirão muitos outros aspectos que entendem ser genuinamente diferentes, mas que não são realmente diversos (tal como em “O Povo” de Prajajati Weekly, 3º ano, número 145). Nenhum deles são diferentes dos de Freud.

Vibhavatanha é uma coisa que os modernos pensadores não compreendem realmente.

(27 Fevereiro 2480)

Todos os objetos dos sentidos são coisas enganadoras

Todos os objetos dos sentidos são ilusões. A ilusão superficial faz parte da esfera da física, por exemplo, as leis do tempo & do espaço que a ciência moderna descobriu. A ilusão profunda faz parte da esfera da metafísica, nomeadamente, o fato de que não possuem liberdade em si mesmos e estão apenas sob o poder das causas e condições, mas que nos enganam e nos fazem amá-los e odiá-los.

(5 Novembro 2480/1937)

 

Em luta com a Natureza

 Lutar com a natureza para a sobrevivência da humanidade. Lutar com nós mesmos para o bem do Dhamma. Lutar com o karma para a compreensão do nibbana.

[“Lutar com o karma” significa libertar-se a si mesmo do bom e do mau karma até que toda a bondade e pecado terminem.]

 (17 de Dezembro 2480/1937)

Nós temos dois níveis de conhecimento:

Nós temos dois níveis de conhecimento, isto é, o conhecimento externo e o conhecimento interno [Dedutivo & Indutivo]. No primeiro, o professor ensina-nos; no último, nós sabemos algo nós próprios através de o experimentar.

Alguém ensina-nos, “o fogo é quente, não lhe toques”. Então, nós possuímos um nível de conhecimento, mas que não tem uma grande abrangência. Mais tarde, nós próprios tocamos no fogo e experimentamos mais profundamente que “o fogo é quente, não deve ser tocado” — na realidade.

Nesta altura, para a maior parte de nós, só ouvimos que “o mundo é dukkha”. É apenas uma espécie de conhecimento externo e assim não existe o desencanto. Se mais tarde formos realmente queimados pelo mundo e o experimentarmos verdadeiramente, tal será outro nível de conhecimento, e este é interno. Ele irá desencantar-nos e compreenderemos a vida suficientemente para sabermos o que devemos fazer.

               (8 de Fevereiro 2541/1938)

© 2011 Centro Buddhista Nalanda

uma tradução de Albano Tavares, para a Comunidade Nalanda, https://buddhadasa.nalanda.org.br